31 Outubro 2018
Novo documento delineando a burocracia do Vaticano indica foco em ajudar as igrejas locais.
A reportagem é de Joshua J. McElwee, publicada por National Catholic Reporter, 30-10-2018. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.
O Conselho Consultivo dos Cardeais do Papa Francisco sugeriu que o pontífice reorganize o Vaticano e faça uma "mudança decisiva", colocando a cidade-Estado a serviço das dioceses católicas locais ao redor do mundo, afirmou um de seus nove membros.
O cardeal indiano Oswald Gracias disse que "a força" de um novo documento que defina a estrutura da burocracia do Vaticano, que está sendo concluído pelo Conselho após cinco anos de trabalho, será ótima "para as igrejas locais".
"Antes, a ideia era ajudar as igrejas locais ajudando o Santo Padre", disse Gracias, Arcebispo de Mumbai, ao NCR. "Agora, a ideia é ajudar o Santo Padre ajudando as igrejas locais."
“Certamente é uma mudança decisiva", observou. "Antes, o foco era apenas ajudar o Santo Padre."
Gracias falou em uma entrevista de meia hora, no dia 25 de outubro, na Casa Santa Marta, no Vaticano, pouco antes da conclusão do Sínodo dos Bispos, no qual ele foi um dos 12 membros da comissão que elaborou o documento final do encontro.
O prelado, que é líder da Conferência Episcopal Indiana, também falou na entrevista sobre sua experiência no Sínodo e suas expectativas para a reunião dos bispos presidentes, em fevereiro do próximo ano, sobre a contínua crise de abusos sexuais clericais.
Ele disse estar preocupado com o curto período para a preparação do evento, que só foi anunciado em setembro. Mas afirmou que espera que extrapole as questões da prevenção do abuso e considere as causas por trás dos motivos pelos quais membros do clero fizeram mal às crianças.
"Estou preocupado com prevenir para que isso não aconteça mais", disse Gracias. "Mas [também] com por que aconteceu."
"Por que razão aconteceu?", questionou. "Qual é a causa?"
"Toda a mentalidade, toda a cultura — e resolver o problema pela raiz", explicou. "É com isso que eu me preocuparia mais."
Francisco tornou a reforma do Vaticano uma das prioridades de seus cinco anos de pontificado. Criou o Conselho de Cardeais em abril de 2013 para ajudá-lo nesse processo.
Os bispos que visitavam Roma em papados anteriores frequentemente ficavam preocupados porque as autoridades católicas eram muito distantes e concentravam-se em questões administrativas, e não pastorais.
O documento que está sendo preparado pelo Conselho dos Cardeais deve delinear a primeira reorganização integral do Vaticano desde a publicação de Pastor Bonus ("O Bom Pastor") por João Paulo II, em 1988. O título provisório do novo texto é Praedicate Evangelium ("Proclamar o Evangelho”).
Gracias não identificou que alterações o documento fará às instituições do Vaticano, mas disse que espera que o grupo faça a entrega formal ao Papa Francisco em uma das duas próximas reuniões, que ocorrem em dezembro e fevereiro.
Em um possível sinal da natureza iminente da publicação do documento, no dia 27 de outubro o Vaticano anunciou que Francisco pediu para um padre italiano e advogado canonista ajudar a revisar o texto e o indicou para o cargo de secretário do conselho.
Gracias também falou sobre a possibilidade de Francisco alterar a participação do conselho.
Ele disse que em uma das últimas reuniões os membros lembraram Francisco que estavam chegando a cinco anos de atuação e que estavam prontos para continuar atuando ou para serem substituídos, conforme a vontade do Papa.
"Ele não tinha dito um período pré-definido, mas quisemos facilitar para ele... deixá-lo livre para fazer as mudanças que quiser", disse Gracias, acrescentando: "Ele não disse que não. Ou seja, está pensando a respeito."
Pelo menos dois membros do Conselho estão sendo investigados por questões relacionadas a abuso sexual.
O cardeal australiano George Pell se afastou do Vaticano em junho de 2017 para ser julgado em seu país por supostos crimes de abuso sexual. O cardeal chileno Francisco Javier Errázuriz Ossa foi citado por vítimas de ter acobertado padres abusivos.
Sobre se essas questões haviam sido discutidas quando o conselho conversou com Francisco sobre possíveis mudanças de composição, Gracias respondeu: "Não houve discussão, mas acho que estava pairando na cabeça de todos”.
A cúpula sobre a crise de abuso sexual, que reunirá os presidentes das conferências episcopais, será a primeira do tipo e deve acontecer de 21 a 24 de fevereiro de 2019.
Para Gracias, o evento "deve ser bem planejado e não apenas superficial."
"Devemos ter algo para levar para casa: conhecimento, confiança, habilidades", observou. "E também uma certa consciência do problema — consciência de como lidar com ele."
Ele refletiu sobre como Francisco considerou o clericalismo uma "perversão" da Igreja, dizendo que a crise "não se trata apenas de abuso sexual, mas talvez seja mais uma sensação de poder — 'Posso fazer qualquer coisa'".
"É uma questão do que chamamos de tolerância zero", disse. "É muito importante para todos nós perceber a situação a longo prazo, os danos irreparáveis que se faz a uma criança."
Quanto à experiência que teve no Sínodo dos Bispos sobre as necessidades dos jovens na atualidade, que ocorreu de 3 a 28 de outubro, ele disse que a presença inédita de cerca de 30 jovens "iluminou" o evento.
A “base sólida” do sínodo foi como a Igreja pode abordar questões reais que os jovens enfrentam hoje em dia, disse Gracias.
"Para mim, a presença dos jovens nos forçou a fazer isso", disse. "Eles não nos deixavam entrar em teorias abstratas."
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Reorganização do Vaticano será uma 'mudança decisiva', diz cardeal Gracias - Instituto Humanitas Unisinos - IHU